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sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Carta aberta sobre os meus velhos camaradas de partido.

Nestes últimos dias pelas páginas dos jornais dois deles trocaram desta forma as suas divergentes atitudes para com o estado a que isto chegou, ou seja, cada qual agarrou o tema pela vertente que melhor lhe poderia servir.

Natural que assim seja, de um lado o presidente do partido Almeida Santos homem de fino trato e de elevado gabarito intelectual, político ao melhor estilo de Richelieu, jurista de fino estilo e orador de irrepreensível prosa, insubmergível nas vicissitudes desta vida muito complicada de negócios, mentiras e traições que as altas esferas praticam com elevada frequência e sem nojo das consequências em que são mestres no aliviar de culpas.

Henrique Neto do outro lado da barricada,pois o tema virou em quase estado de guerra, um militante socialista fora do aparelho partidário, proprietário a justo título da mais relevante posição de anti-sistema, homem de fábrica, conhecedor de todos os degraus desta vida difícil para quem nasce pobre, duro no trato, sem rodriguinhos na forma, objectivo como aqueles que não têm tempo a perder, as formas só magoam quem aí se detiver, são detalhes com pouca valia na substância, têm por fundo a dor do engano, a mágoa do logro, palavra de rei, de honra, como político fora do seu tempo, onde as conveniências são regra.

Gosto especialmente de ambos, mais por sempre admirar e ignorar os que os faz agir e porque teimam nos seus papéis. São as mais das vezes homens úteis, seguramente conscientes da legitimidade dos seus actos e seguros da sua imprescindível valia nesta vida política que animam e de que se alimentam, sabem, estou disso convicto, que são usados, dando conforto aos pólos opostos desta louca barganha, viciada e triste.

Dos velhos camaradas que já partiram recordo o exemplo, para mim maior, do Tito de Morais, militámos os dois numa humilde secção de bairro desta nossa capital, e como era reconfortante para a minha irrequieta juventude a sua ternura num deserto de anuências.

Um momento de camaradagem, que nunca esquecerei, prenhe de algo indescritível, quando o dirigiam à mesa de voto, numas vulgares eleições internas, instalada num Hotel perto da avenida de Roma, numa maca, pois a sua longa existência física a isso o obrigava, me estendeu a sua mão amiga e comida da fraqueza dos anos, me segredou “Ramalho quem são os nossos?”, não me recordo o que lhe disse, hoje sei que ele será eternamente dos meus.

Espero continuar a considera-los como também dos meus.

Lisboa, Fevereiro de 2011


Armando Ramalho

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