Não
faz sentido algum nos dias de hoje a expressão a “caixa que mudou o mundo”. Perpassa
um arrepio só de pensar como era sinónimo de novidade e modernismo, senão mesmo
clarividência politica há meia dúzia de anos, opinar sobre os benefícios do
progresso tecnológico e os contributos que tal objeto representaria para o
futuro radioso da vida em comunidade, totalmente informada, culta, civilizada, harmoniosamente
globalizada.
Já
não é caixa, é mais moldura, interiorizada por muitos como um ser vivo com
vontade própria. O meu propósito é sem dúvida alguma desconstruir ideias feitas
sobre o futuro da “coisa”, mas por ora limitemo-nos aos positivos efeitos de se
dispor de um colossal arsenal de informação em tempo real, e o que se pode
processar de efeitos práticos no sentido económico e político.
Um
elemento isolado, um átomo selecionado no turbilhão diário pelo critério da
utilidade e competência reconhecida do mensageiro televisivo, pode bem fazer a
diferença de uma vida, como a pepita que se revela ao desanimado garimpeiro que
desespera perante tamanho deserto de ideias de que é feita a política nacional,
menor e vazia, que diariamente nos massacra e destina ao triste vazio a
existência pátria. Só pode ser essa a razão de ficarmos colados a esta relação
equívoca, retiramos prazer por termos esperança.
A
pepita televisiva veio da forma prevista, sabida de véspera por anúncio no
mesmo programa da “passagem” por ali do Prof. Vera Cruz Pinto num “face a face”
de 30 minutos com a famosa Campos Ferreira do Prós e Contras, também apresentadora
do canal público no cabo, em serviço de rebocador de audiências, entalada no
horário dos programas vedeta da SIC N e da TVI 24.
Vera
Cruz foi à oral, era sabido e foi confessado que tinha pavor “daquela coisa” como
justificação das recusas aos insistentes convites que lhe têm vindo a ser dirigidos
há longa data. Não ouve rasgo nas questões. Poucas foram necessárias como bem
observou. O orador dispensou trivialidades e banalidades costumeiras em
académicos agarrados à imagem que de si próprios têm.
Entrou
com simplicidade desconcertante e sem grandes piruetas eloquentes por caminhos secretos
da alma e da vida, mas ficou-se pela divisão da entrada, deixando antever os
vastos domínios, de que só os iniciados atentos no relacionamento com o
personagem poderiam ter provocado a revelação. Ficaram nítidas as múltiplas facetas
do seu saber, de uma vida partilhada com clássicos gregos e romanos, mesmo de alguns
modernos é íntimo, um feixe de linhas que fugiram a uma interlocutora mais admirativa
que inquisidora, embevecida, fora do seu registo habitual de controladora e
dominadora do tema e do espaço.
Ficou
nitidamente perplexa perante o manancial e o potencial da figura que tinha pela
frente, via a fluidez discursiva desenvolta, sacudindo ideias feitas da crise, denunciando
com a firmeza dos convictos os entraves ao seu mister, espraiando um sotaque
que não disfarçava as origens africanas, separando o trigo do joio com a leveza
de uma pena. Tudo isto em levas de conforto desinibido mas com pudor e prudência,
um mestre do saber académico, um humanista prático, como diria um poeta,
amassado na vida começada cedo, intensa e bem resolvida ou quase.
A
“coisa” mudou o mundo para melhor? Talvez. Decididamente resolve as dúvidas da
ignorância. Informa em direto, Obama eleito em direto uma boa notícia, o
congresso chinês em direto uma real expectativa, o Vera Cruz Pinto em direto uma
certeza, um mundo melhor? Veremos.
FDL armando ramalho
Lisboa 14 de Novembro de 2012
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